Priscila Moreira Amaro

Nematologista – Nema no Campo – Amaro Consultoria Agronômica e Treinamentos Ltda.

nemanocampo@gmail.com

Rodrigo Vieira da Silva

Engenheiro agrônomo, doutor em Fitopatologia e professor – Instituto Federal Goiano – Campus Morrinhos/GO

rodrigo.silva@ifgoino.edu.br

Rafaella Alves Rodrigues

Isabeli Barbosa Brito

Graduandas em Agronomia – IF Goiano – Campus Morrinhos

A adubação verde proporciona inúmeras vantagens ao cultivo de hortaliças, uma vez que as espécies de plantas utilizadas com essa finalidade apresentam características que melhoram as condições físicas, químicas e biológicas do solo, de modo que são essenciais para serem utilizadas em áreas com baixa fertilidade, além de serem uma ótima opção para o manejo de pragas e doenças, principalmente os nematoides.

Os fitonematoides são vermes parasitas de raízes e da parte aérea dos vegetais que causam perdas de cerca de US$ 30 bilhões no mundo, somente nas hortaliças, representando cerca 10 – 12% da produção mundial. Para um manejo eficiente, várias ferramentas devem ser adotadas, e o uso de adubos verdes ganha destaque com esse propósito.

Estas plantas podem atuar como plantas-armadilhas, não hospedeiras ou antagonistas aos fitonematoides, além de aumentar a atividade e diversidade biológica do solo. Em alguns casos, ocorre a liberação de substâncias nocivas aos nematoides após a decomposição do material vegetal.

Tipos de adubos verdes

A adubação verde é uma prática que consiste em plantio de espécies em sucessão, rotação ou em consórcio, cobrindo o solo por determinado tempo. Posteriormente são roçadas e incorporadas ao solo ou mantidas na superfície como palhada. Em áreas de cultivo de hortaliças, adubos verdes com espécies de gramíneas e leguminosas podem ser utilizadas com propósitos diferentes.

As plantas conhecidas como leguminosas, atualmente pertencentes à família Fabaceae, são essenciais para disponibilização de nutrientes em camadas mais profundas do solo e também para fixar o nitrogênio disponível na atmosfera, tornando o solo mais fértil. As espécies mais utilizadas são as crotalárias, amendoim forrageiro, guandu, siratro, mucunas e feijão-de-porco.

As gramíneas (Poaceae) são utilizadas com o objetivo de estruturação do solo e para fornecer matéria orgânica, com destaque para as braquiárias, capim-colonião, milho, milheto e sorgo. Espécies de outras famílias, a exemplo do girassol, nabo forrageiro e cravo-de-defunto também são utilizadas como adubo verde.

Formas de cultivo

A utilização pode ser realizada de maneira solteira em épocas em que não seja viável o cultivo de hortaliças, mantendo o solo coberto e evitando o aparecimento de plantas daninhas, além de outros benefícios para o solo e todo o agrossistema, como por exemplo, o manejo de pragas e doenças.

O cultivo em consórcio é realizado quando a cultura e o adubo verde são plantados simultaneamente ou em faixas de cultivo, sendo o mesmo cortado de período em período para adubar a cultura. Este é recomendado em algumas situações como: abóbora com guandu, batata-doce com crotalária, berinjela com caupi, quiabo com crotalária, quiabo com feijão-de-porco.

Fixação biológica de nitrogênio – FBN

As plantas leguminosas se destacam na capacidade de realizar uma associação com bactérias fixadoras de nitrogênio da família Rhizobiaceae, conhecidas como rizóbios. Essas bactérias capturam o nitrogênio do ar (N2) e convertem o nutriente em outras formas de nitrogênio assimiláveis pelas plantas, diminuindo a necessidade de aplicação de adubos nitrogenados.

Na interação das bactérias com as raízes das plantas ocorre a formação de nódulos. Nessa estrutura ocorre o processo de fixação biológica de nitrogênio, onde toda a demanda de nitrogênio pode ser suprida pela FBN.

A quantidade de nitrogênio fixada varia entre as espécies, as crotalárias, por exemplo, podem fixar em 1,0 hectare até 183 kg de nitrogênio/ano e produzir de 20 a 30 toneladas de fitomassa. Além disso, destaca-se também como uma ótima opção o manejo dos principais nematoides presentes nas áreas de hortaliças, como: nematoide-de-galhas (Meloidogyne incognita, M. javanica), nematoide das lesões (Pratylenchus brachyurus) e o nematoide reniforme (Rotylenchulus reniformis).

Benefícios do uso da adubação verde e FBN

A adubação verde junto à FBN pode trazer diversos benefícios para o sistema produtivo e para o produtor rural, principalmente nas áreas de hortaliças, que tem alto custo de produção.

Dentre os benefícios estão:

• Menor uso de adubos nitrogenados, que resulta em economia para o produtor;

• Redução da emissão de gases do efeito estufa;

• Melhoria nas características físicas, químicas e biológicas do solo;

• Aumento de produtividade, principalmente em solos pobres em nitrogênio;

• Ciclagem de nutrientes – as plantas utilizadas em adubação verde têm capacidade de disponibilizar nutrientes em profundidade no perfil do solo;

• Promoção de crescimento de plantas – algumas bactérias utilizadas na FBN também possuem capacidade de produzir hormônios que aumentam o crescimento radicular;

• Manejo de doenças e pragas.

Nematoides em hortaliças

Os nematoides parasitas de plantas constituem-se num fator limitante para a produção agrícola, e nas hortaliças não é diferente, ocorre a redução na produtividade, além de sintomas que afetam a qualidade visual, devido a deformações, protuberâncias, galhas, lesões, apodrecimento, que prejudicam o valor comercial dos produtos que são consumidos in natura.

Os principais nematoides que causam prejuízos às hortaliças no Brasil encontram-se na Tabela 1.

Tabela 1. Principais espécies de nematoides importantes para as hortaliças no Brasil

Nome comum Espécies Hortaliças
Nematoide-das-galhas M. enterolobii, M. incognita, M. javanica, M. ethiopica, M. hapla, M. arenaria Alface, cenoura, batata-doce, beterraba, cebola, cucurbitáceas (abóboras, abobrinhas, melão, morangas, pepino), solanáceas (batata, pimenta, pimentão, jiló, berinjela, tomate).
Nematoide-das-lesões-radiculares Pratylenchus brachyurus, P. penetrans, P. coffeae Batata, mandioquinha-salsa, inhame, cenoura, jiló, quiabo, tomate, pimentão, batata-doce, ervilha.
Nematoide-do-amarelão-do-alho Ditylenchus dipsaci Alho, cebola.
Nematoide reniforme Rotylenchulus reniformis Coentro, melão, alface, batata-doce, melancia, tomate, quiabo.
Nematoide da casca preta do inhame Scutellonema bradys Inhame, cará e mandioquinha-salsa
Nematoide espiralado Helicotylenchus dihystera Cenoura.

Adaptado do livro: Nematoides em hortaliças, Embrapa. 2017

Adubos verdes no manejo de nematoides

A convivência com o patógeno nas áreas de cultivo só é possível com uso de ferramentas de manejo integrado de nematoides, que consiste no uso de cultivares resistentes, nematicidas químicos e biológicos e também manejos culturais, como uso de mudas e sementes sadias, manejo de plantas daninhas nas áreas e rotação de culturas.

Para o uso eficiente dos adubos verdes no manejo de nematoides, alguns pontos devem ser considerados, como:

• Diagnose das espécies de nematoides presentes na área – a reação das plantas é diferente para as espécies de nematoides;

• Tempo de rotação, que varia de acordo com a situação de cada área. Em áreas com altas densidades de nematoides são necessários períodos maiores de rotação, para obter melhores resultados;

• Uso de plantas com característica antagonista.

Forma de controle dos nematoides

Algumas plantas de adubação verde atuam como antagonistas aos fitonematoides, diminuindo a densidade populacional da espécie na área de cultivo. Um bom exemplo são crotalárias que agem como plantas armadilhas, onde ocorre a penetração dos juvenis de segundo estádio de Meloidogyne spp. (J2), mas não permitem o seu desenvolvimento até a fase adulta.

Inicialmente, atuam como hospedeiras, atraindo os nematoides para as raízes, mas não permitem que completem o seu ciclo reprodutivo. Outro mecanismo de ação das plantas antagonistas seria a liberação de compostos com atividade tóxica aos nematoides, que inibe a sua alimentação nas raízes.

Um exemplo deste tipo de planta é o cravo-de-defunto (Tagetes spp.), que produz o alfatertienil. Devido à ação dessa substância, os nematoides de galhas morrem e a população do nematoides reduz drasticamente no solo.

Resultados práticos

Com o uso adequado dos adubos verdes, é possível reduzir a populações dos nematoides nas áreas e melhorar os fatores químicos, físicos e biológicos do solo que auxiliam na capacidade da cultura principal tolerar a presença dos nematoides.

Diversos trabalhos demonstram o efeito positivo de espécies de crotalária, cravo-de-defunto e mucuna no controle de M. javanica e M. incógnita, que são as principais espécies que parasitam a cenoura no Brasil. O nível de controle destas espécies de nematoides-de-galhas varia de 30 a 90% de eficiência.

Em trabalho de pesquisa realizado no setor de olericultura da UFLA, em cultivo orgânico de repolho, a incorporação das espécies de adubos verdes mucuna-preta e crotalária reduziu a população de Meloidogyne spp. em 42 e 51%, respectivamente.

Vale ressaltar que em áreas com altas densidades populacionais de fitonematoides, antes do plantio de uma cultura deve-se planejar utilizar mais de uma ferramenta de manejo. Mesmo que tenha sido utilizada rotação anteriormente, o nematoide possui grande capacidade de multiplicação em hortaliças. Isso favorece o aumento rápido da densidade e, por consequência, redução de produtividade, menor valor comercial e prejuízos para o produtor.

Tabela 2. Reação de culturas para as principais espécies de nematoides

Adaptado de Inomoto et al. (2010)

Análise de custo-benefício

A adubação verde, do ponto de vista técnico e econômico, é viável, visto que a implantação e condução desses adubos possui um custo consideravelmente baixo e o seu retorno é significativo.

Para saber o gasto total da implantação dessa técnica é necessário, primeiramente, fazer um planejamento, com a soma de todos os valores necessários, desde a compra de sementes e mudas, inclusive as despesas com combustível e manutenção de maquinários.

Conhecer as nuances da propriedade, definir os objetivos da tecnologia, fazer a escolha correta do adubo, preparar o solo de maneira adequada, o plantio e a incorporação do adubo verde no momento certo ao solo são fatores essenciais para garantir uma boa rentabilidade.

Alguns horticultores são reticentes no uso da estratégia de cultivo de plantas para adubação verde, pois os resultados, em muitos casos, não são imediatos. No entanto, é possível afirmar que essa tecnologia é lucrativa, constituindo um investimento, principalmente, a médio e a longo prazos.

Vale ressaltar outros benefícios: produção de fitomassa, fixação biológica de nitrogênio, aumento da fertilidade do solo, acúmulo de matéria orgânica, aumento da porosidade, da infiltração e retenção da umidade no solo, diminuição de erosões, controle de plantas daninhas e nematoides.

Considerações

A utilização de técnicas mais amigáveis com o meio ambiente é essencial para o sucesso da agricultura atual. Neste contexto, o uso de adubação verde é essencial para a melhoria das áreas de cultivo de hortaliças, que é amplamente prejudicada pela presença dos nematoides.

Além disso, a FBN que ocorre na maioria das plantas indicadas é essencial para o desenvolvimento das culturas, entre outros benefícios citados nesse artigo.

Fonte: https://revistacampoenegocios.com.br