Créditos de carbono: Brasil pode ter receita de até R$ 100 bilhões

Créditos de carbono: Brasil pode ter receita de até R$ 100 bilhões

Alessandro Zabotto
Consultor em ESG e sócio da BRCC Carbon Credit
alezabotto@gmail.com

O Brasil tem potencial de gerar até R$ 100 bilhões em receitas com créditos de carbono nos setores do agronegócio, floresta e energia até 2030. O valor seria correspondente a 1 bilhão de toneladas de CO2 equivalente, de acordo com o um estudo feito pela consultoria especializada em sustentabilidade WayCarbon sob encomenda da International Chamber of Commerce Brasil (ICC Brasil), que trata de oportunidades para o país nesse mercado.

O crédito de carbono é um instrumento que visa estimular a redução das emissões de gases de efeito estufa por meio de um estímulo financeiro.

Entenda o processo

Antes de falarmos sobre os créditos de carbono, vamos fazer uma breve introdução de como surgiu o mercado de carbono. Partimos da premissa de que o crescimento exponencial da população aliado à urbanização após a revolução industrial só foi possível graças ao aproveitamento de combustíveis fósseis.

Ou seja, para a produção de energia utilizando combustíveis fósseis é necessária sua queima, que além de energia produz diferentes quantidades de alguns gases, como dióxido de carbono, vapor d’água e óxidos nitrosos, dentre outros.

Essa atividade gerou uma série de efeitos sobre nossa atmosfera, aumentado consideravelmente a quantidade de gases, conhecidos como gases do efeito estufa (GEE).

A maior concentração desses gases intensifica o chamado efeito estufa, gerando mais calor e, consequentemente, elevando a temperatura terrestre. De acordo com modelos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em 2100 o planeta poderá ter um aumento na sua temperatura média de até 4.2°C em relação ao período pré-industrial.

Nesse sentido, podemos destacar que a humanidade não apenas aumentou a quantidade de CO2 pela queima de combustíveis fósseis e outras atividades antrópicas, mas também interrompeu o ciclo de dióxido de carbono na natureza ao derrubar as florestas.

Mercado de carbono

Diante desse cenário, no ano de 1997, foi criado o mercado de carbono durante as negociações do Protocolo de Kyoto. O mercado de carbono, de forma geral, nada mais é do que um sistema de compensações de emissão de carbono ou equivalente de gases de efeito estufa (CO2e).

Esse sistema se dá por meio da aquisição de créditos de carbono por empresas ou países que não atingiram suas metas de redução de gases de efeito estufa, daqueles que reduziram as suas emissões. Dentro desse mercado, temos o mercado regulado, vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU) e conhecido como “cap-and-trade“, onde figuram os países desenvolvidos que possuem metas de redução de GEE, e o mercado voluntário, também chamado de “Non-Kyoto Market”, onde o Brasil está inserido.

Este último atende a demanda por créditos de empresas ou pessoas físicas interessadas em reduzir as emissões de GEE em suas atividades econômicas de forma voluntária.

Resumindo, enquanto o mercado de carbono regulado surgiu em decorrência do Protocolo de Kyoto e as urgências em relação às mudanças climáticas, o mercado voluntário surgiu de forma paralela ao protocolo.

Como funciona

O crédito de carbono nada mais é do que a moeda do mercado de carbono e funciona assim: os países que conseguem reduzir suas emissões de GEE podem emitir créditos de carbono.

Ou seja, os créditos de carbono representam a não emissão de dióxido de carbono ou equivalente à atmosfera, sendo que cada crédito de carbono equivale a uma tonelada de gases GEE. Desta forma, os créditos emitidos podem ser negociados com países que não atingiram as suas metas.

Assim, quanto maior o empenho de um país em reduzir a emissão de poluentes, maior o volume de créditos ele poderá gerar e comercializar com outros países que não tenham atingido suas metas de redução.

Cabe salientar que, neste caso, estamos falando do mercado regulado, em que os países possuem metas de redução. Os créditos de carbono gerados por projetos em países que não possuem metas, ou seja, no mercado voluntário, também podem ser comercializados, mas não valem como meta de redução para os países que fazem parte do acordo internacional.

Vantagens da prática

O mercado de crédito de carbono pode proporcionar inúmeras vantagens para as empresas e governos locais. Além da questão da preservação do meio ambiente e dos benefícios sociais, temos outros, como o retorno financeiro por meio da compra e venda de créditos de carbono, alavancando, inclusive, a imagem da empresa.

Ainda, o engajamento dos colaboradores estimula a consciência ambiental e as ações de responsabilidade social. Outro ponto que merece destaque é sobre novos investimentos, visto que um ambiente empresarial sustentável aumenta a confiança do mercado, podendo atrair novos investidores.

Setor florestal

As florestas desempenham papel fundamental na mitigação das mudanças climáticas, por meio do sequestro e armazenamento de carbono. Diante deste fato e da dimensão das florestas brasileiras (temos aproximadamente 488 milhões de hectares de florestas nativas), o setor florestal tem enorme potencial de geração de créditos de carbono por meio da sua conservação.

Hoje sabemos, por meio de muitos estudos científicos, que manter a floresta em pé traz excelentes ganhos financeiros. Ainda, alguns pesquisadores têm discutido a importância da geração de crédito de carbono pelas florestas plantadas para fins comerciais, como as de eucalipto e pinus, visto que o Brasil possui mais de 9 milhões de hectares de florestas renováveis.

Quem ganha?

Podemos citar vários benefícios para o produtor, como por exemplo, o aumento da rentabilidade. Apesar de o mercado, neste momento, apresentar preços baixos do crédito de carbono, o que ao meu ver está relacionado com a necessidade da regulamentação do mercado, os investimentos em projetos de créditos de carbono são de médio a longo prazos, criando uma oportunidade para o produtor para venda futura desses créditos, ou seja, no momento ideal para a comercialização em uma possível alta do mercado.

Estímulo financeiro

Os financiamentos para a estruturação de projetos visando a geração de créditos de carbono no Brasil podem ser financiados não só pelos produtores, mas também por empresas do setor e fundos de investimentos existentes no mercado.

Na esfera pública, o Banco do Brasil lançou, nesse ano, um fundo de investimento de R$ 2 milhões para financiar iniciativas de créditos de carbono. O BNDES, em março deste ano, também lançou um edital, porém direcionado à aquisição de créditos de carbono no mercado voluntário, com orçamento total de R$ 10 milhões.

Apesar desses editais não atenderem a demanda crescente por financiamento de projetos, essas iniciativas promovem maior discussão sobre o tema e abrem a possibilidade de novos investimentos públicos.

A prática

No setor florestal, tanto para o mercado regulado quanto para o mercado voluntário, temos os projetos REDD+ (do inglês Reducing Emissions from Deforestation and Forest Degradation ou Redução de Emissões por Desmatamento ou Degradação Florestal), que é um mecanismo utilizado para reduzir as emissões de gases de efeito estufa por desmatamento e degradação florestal.

No Brasil, foi criada a Comissão Nacional para REDD+ (CONAREDD+), que por meio da resolução número 3 de 22 de julho de 2020, reconhece a contribuição do mercado voluntário de carbono florestal.

Tendências

Segundo informações passadas pelo governo brasileiro na COP26 realizada em 2021, o Brasil tem potencial para ser protagonista nesse mercado, com aproximadamente 20 a 25% das exportações ou transações.

Porém, destaco a importância da regulamentação do mercado brasileiro. Hoje, temos um projeto de Lei – PL 528/2021, que está parado na câmara dos deputados desde fevereiro de 2021.

Portanto, além dos esforços de algumas entidades brasileiras, necessitamos de empenho político para a tramitação da proposta. A regulamentação através de uma legislação específica nos dará mais segurança nas transações, além da definição dos setores da economia e parâmetros para redução dos GEE.

Novidades

O mercado de créditos de carbono brasileiro tem um enorme potencial, não somente no setor florestal, mas em outras atividades, como geração de energia renovável, gerenciamento de resíduos em aterros com a captação do gás metano, melhoria das práticas e manejo nas atividades agrícolas, restauração de áreas degradadas, dentre outras.

Precisamos realmente estruturar esse mercado com metas e objetivos robustos, investir em ciência e tecnologia eficazes na mensuração das reduções de acordo com a atividade e, claro, conscientizar as empresas e a sociedade da gravidade da crise climática.

Fonte: https://revistacampoenegocios.com.br