José Geraldo Mageste – Engenheiro florestal e PhD – jgmageste@ufu.br
Rafael Pereira Silva – Engenheiro ambiental – rafaelpereiraufu@gmail.com
Aline Alves Costa – Engenheiro ambiental e sanitarista – alinealvesc23@gmail.com
A mesorregião do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba é um
importante polo cafeeiro, reconhecida majoritariamente pela produção de café
irrigado a pleno sol em Minas Gerais. Entretanto, a deficiência hídrica e as
oscilações climáticas vêm afetando a produção nos últimos anos, em decorrência
da intensa utilização dos recursos hídricos e do solo, acrescendo-se ainda o
elevado custo dos fertilizantes e dos controles fitossanitários pelo aumento de
pragas e doenças.
Desse modo, a implementação de Sistemas Agroflorestais
(SAF’s) torna-se uma estratégia por priorizar a diversificação das lavouras,
com o cultivo simultâneo de espécies arbóreas (exóticas ou nativas) em uma
mesma área. Os SAF’s tornam-se indispensáveis para os produtores que buscam
aumentar e diversificar a renda, além de trazer maior resiliência ambiental
para sua propriedade.
Contudo, para se obter sucesso é necessário um bom
planejamento, resultado de um diagnóstico singular para elaboração de um
projeto específico para cada agricultor e propriedade. A seleção das espécies
considera o acesso ao mercado e suas demandas, as condições ambientais da
região, além da sinergia entre as espécies agrícolas e florestais no sistema.
Por isso, as possibilidades para os SAF’s configuram-se em variações no espaço
e no tempo de diferentes desenhos e arranjos.
Assim, o objetivo deste foi realizar um levantamento de
espécies florestais potenciais para exploração da madeira e dos produtos
florestais não-madeireiros (PFNM) em consórcios agroflorestais com café na
mesorregião, com produções ao longo de pelo menos 20 anos consecutivos.
Sistemas agroflorestais para
produção de café
Na cafeicultura de clima quente, o bicho-mineiro (Perileucoptera
coffeella) é considerado a principal praga, sendo o controle difícil e de
alto custo. Os sistemas agroflorestais possibilitam o controle biológico, pois
permitem escolher espécies que atraem inimigos naturais, além de propiciar um
microclima para o cafezal através do sombreamento, reduzindo a temperatura do
solo e do ar, e mantendo a ecofisiologia do café em equilíbrio.
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Quando respeitamos a ecofisiologia das plantas, evitamos que
elas entrem em estado de estresse, sendo um dos desencadeadores de doenças e
ataque de insetos, o que influencia também na qualidade dos frutos.
Principalmente na produção de cafés especiais, cujo foco é a
qualidade da bebida, os estudos atuais demonstram que é consenso entre
pesquisadores e agricultores que o sombreamento das lavouras contribui para a
redução da bianualidade da produção e na maior qualidade dos frutos, gerando
bebidas mais encorpadas e aromáticas.
Independente do espaçamento adotado, é necessário o manejo
silvicultural de podas e desbastes das árvores, pois além de promoverem maior
aporte de matéria orgânica no solo, fazem o controle do sombreamento e da
entrada de luz nas lavouras no momento correto, importante para a indução
floral do cafeeiro.
Potenciais espécies madeireiras
Árvores de café e frutíferas também podem ser consideradas
madeireiras, apesar de denominarmos de espécies madeireiras as árvores que têm
como principal objetivo de uso a extração de madeira.
O café possui madeira de densidade alta e com excelente
produção de energia (mais de 4,0 mil kcal/kg). Fazendo podas frequentes no
cafeeiro, tem-se rendas consideráveis com a venda da lenha. Embora a cidade de
Pirapora não esteja na região do Triângulo Mineiro, o cultivo de café conilon (Coffea
canephora) naquela cidade tem-se mostrado com excelente produção de lenha,
já que esta variedade deve ser podada com certa frequência.
A espécie arbórea de maior área cultivada com este café é o
mogno brasileiro (Swietenia macrophylla) e o Nim (Azadirachta indica).
Estas espécies possuem elevada taxa de retorno e sustentam com excelência a
produtividade consorciada.
Já as espécies madeireiras encontradas em variada frequência
no cultivo de café no Triângulo Mineiro, em Sistemas Agroflorestais, são:
acacia mangium, cedro australiano (Toona ciliata), guanandi (Calophyllum
brasiliense), e mognos africanos (Kaia grandifoliola e Kaia Senegalensis, as preferidas nos
projetos florestais de madeira nobre), este último sendo bem recomendado para o
Cerrado pela boa resistência ao período de estiagem.
O Corimbya citriodora (também chamado de Eucalyptus
citriodora num passado recente), a seringueira (Hevea brasiliensis)
e o pinus (caribae hondurensis) possuem as maiores áreas cultivadas,
tanto em monocultivos como em SAF´s. Também são encontrados o nim, o mandiocão
(Schefflera morototoni) para produção de lápis, o paricá (Schizolobiumamazonicum) em Nova Ponte e Uberaba, e guapuruvu (Schizolobium
parahyba) em Uberlândia e Santa Vitória. Estes dois últimos do gênero Schizolobium
superam qualquer gênero de eucalipto em produtividade.
Além dessas citadas, outras potenciais espécies para
consórcios agroflorestais são o ipê-tabaco (Zeyheria tuberculosa), de
madeira densa (0,80 g/cm³) de alta durabilidade natural, sendo empregada em
construção civil como estruturas de casas e em peças decorativas. O louro pardo
(Cordia trichotoma), com madeira um pouco menos densa que o ipê-tabaco,
é empregada em móveis finos e revestimentos decorativos, considerada de alta
qualidade por madeireiros.
Por fim, o baru (Dipterix alata), espécie nativa de
madeira muito densa (0,90 a 1,2 g/cm³), com possibilidade de exploração do
fruto como produto florestal não-madeireiro (PFNM). Sua castanha vem
apresentando uma crescente valorização pelo mercado nos últimos anos, variando
de R$ 50 a R$ 100, seu quilo torrado.
A polpa do fruto, depois de beneficiada, pode ser
comercializada a valores equivalentes ao da castanha. Já o endocarpo (cápsula
que envolve a castanha) pode ser comercializado para produção de carvão, pois
possui altíssimo poder calorífico, sendo considerado o melhor carvão do
Cerrado.
Cuidados básicos do plantio à
colheita final
Deve-se atentar à escolha dos espaçamentos das árvores no
sistema de acordo com o objetivo desejado pelo produtor, podendo variar de
arranjos agroflorestais mais adensados a menos adensados.
Pode-se implementar, por exemplo, renques de árvores a cada
12 metros, com duas ou três linhas de café entre os renques para uma colheita
mecanizada, assim como podem ter sistemas que as árvores estejam nas mesmas
linhas de café, e que essas linhas de plantio tenham somente 6,0 m de
entrelinhas, com uma linha de café entre elas.
Nesses sistemas, deve-se também atentar às direções do sol e
dos ventos ao longo dos dias e meses do ano para que todas as espécies
beneficiem-se simultaneamente, sem comprometer a produção.
Podas
Outro cuidado quase sempre ignorado é a poda. Todo
povoamento deve sofrer podas e desbastes, o que aumenta muito o valor final da
madeira. Até mesmo plantios de pinus (Pinus Caribae Hondurensis)
precisam passar por estes tratos silviculturais.
Podas bem conduzidas ajudam a reduzir a quantidade de nós
soltos nas tábuas, dão melhor aparência ao móvel e aumentam a resistência da
madeira. Existem bons capítulos de livros sobre podas. A recomendação é que não
devem ser removidos mais que 1/3 da copa das árvores.
Além de tudo, não é necessário realizar corte raso. As podas
e desbastes possibilitam a antecipação de receitas. Pode-se fazer desbastes
retirando os indivíduos dominados primeiro e depois os demais. Os últimos
renderão muito mais e darão madeira muito mais nobre, e por meio dos desbastes
o produtor antecipa o retorno financeiro para espécies de ciclo longo dentro do
sistema.
Mercado
Mais importante que a
definição de mercado, deve-se levar em consideração a Taxa Interna de Retorno
(TIR), ou outro método de estudar a viabilidade econômica de qualquer
empreendimento. Numa avaliação rápida de viabilidade, pode-se apontar os
seguintes usos da madeira:
; Móveis – pinus e
mognos oferecem melhores retornos (R$ 2.000,00/m³ para madeira de mogno serrada
e seca em estufa).
; Carvão vegetal –
R$ 400,00/mdc. Qualquer uma delas pode ser aproveitada para este fim, mas não é
nobre fazer carvão de espécies como o nim, cedro, guanandi, e teca (Tectona
grandis), por exemplo. No entanto, os galhos mais finos dessas espécies
podem ser usados para enchimento de portas (quando você compra uma porta de
compensado, porta não maciça, nem imagina qual madeira serviu de enchimento).
Além desses usos, ainda existe o mercado de ripas.
; Moirões – a
demanda é uma grande realidade, e de longe o C. citriodora e E.
cloezina são os melhores e os mais indicados.
Outro exemplo é o uso de pinus tropicais, como o Pinus taeda
ou Pinus elliotti para o mercado de resina. A resina é usada para
produção de gomas, de tintas e outra infinidade de produtos. O preço da resina
varia muito entre os anos, mas estamos vivendo uma fase boa.
Independente do uso final, é um grande desperdício cortar
uma árvore e usá-la para um único fim. Aqui na região existe uma grande demanda
de cavaco. Corta-se uma árvore de 34 metros de altura e pica-a totalmente.
Entendemos que o cavaco é importante para produção de vapor,
movimentando um monte de indústrias, mas poderia dar oportunidade de uso mais
nobre, pelo menos para o terço inferior das árvores. Os cavacos poderiam ser
feitos com as pontas. A mais grossa para moirões ou serraria; a média para
estacas e as pontas para energia.
Padronização e qualidade
O mercado busca padronização e qualidade final do produto. O
preço é definido pelas suas propriedades físicas, dimensões, estética e
durabilidade. Existem, por exemplo, serrarias especializadas em processar
somente madeira de seringueira.
Eles pagam bem quando eles mesmo fazem a poda e a secagem da
madeira. Ela tem sido usada para tamancos e paletes. Um mercado em crescimento,
tanto no norte de São Paulo quanto no Triângulo Mineiro. No Sul de Minas (Camanducaia), por exemplo,
tem uma serraria que já passou de pai para filhos e funciona adequadamente todo
o tempo.
Dúvidas e soluções
Há muitas dúvidas sobre a realidade do mercado florestal
dessas espécies, e se há mercado promissor. Para aqueles que não estão
presentes no Triângulo Mineiro e dentro do mercado, estas dúvidas são
corriqueiras, mas de fácil solução.
Uma pesquisa local para conhecer a realidade das serrarias
instaladas na região, complementada com um bom diálogo com as empresas
consumidoras de madeiras para diversos usos, e entre os pioneiros que produzem
madeira, vão mudar esta visão para melhor entendimento dos lucros dessa área.
Um pessoal já veio de São Paulo para colher cinco árvores de
paricá (Schizolobium amazonicum), plantados em Nova Ponte. Todos ficaram
satisfeitos, fazendeiro e moveleiro. Uma opção interessante é a realização de
parceria para produção de móveis com alto valor agregado.
Não temos tradições ou cultura de silvicultores. Como temos
pouca tradição, 10 hectares é uma área boa para começar. Devemos empregar
técnicas silviculturais e planejamento para produção contínua.
Se reunirmos esforços, podemos consolidar cadeias produtivas
pela constituição de cooperativas e serrarias para processamento dos produtos,
otimizando os custos e agregando valor. É preciso investir em conhecimento. Não
se pode entrar no negócio de produção de madeira sem consultar a ciência
florestal.
Existiu todo um esforço para entender o planejamento
florestal. Professores, alunos e silvicultores dedicam grande parte do seu
tempo ao planejamento. Existem bons exercícios de economia florestal. Eles
ajudarão qualquer um que deseja aumentar a sua formação técnica.
Contudo, é possível afirmar que as espécies citadas
constituem boas opções, com potencial para comercialização no mercado regional.
Salienta-se que, apesar destas espécies florestais também constituírem boas
opções para consórcios com o café, é indispensável uma análise financeira
individual feita por profissionais qualificados, onde serão levantados todos os
potenciais e as limitações de cada área e do produtor, podendo assim gerar um
projeto individual e específico que possibilitará a viabilidade e o sucesso do
SAF.