Rafael Simoni
Engenheiro agrônomo, especialista em consultoria e assistência técnica em hidroponia
rafaelsimoni@agronomo.eng.br
A alface é, atualmente, a hortaliça folhosa de maior consumo no Brasil. Dada a sua versatilidade, pode ser usada em combinação com diversas outras folhosas em saladas, bem como em lanches como sanduiches de baixa caloria e também em lanches quentes, como hambúrgueres.
A produção dessa folhosa no Brasil, segundo a Companhia Brasileira de Abastecimento (CONAB), foi de aproximadamente 575 mil toneladas em 2020. Destes, estima-se que até 10% seja em produção hidropônica. Essa estimativa ainda é imprecisa, visto que o sistema hidropônico vem crescendo dia a dia.
Vantagens
Algumas vantagens em relação ao processo de produção convencional contribuem para o aumento de produtores que vêm adotando o sistema de produção em hidroponia, dentre as quais podem ser destacadas:
– Maior produtividade por unidade de área, já que as plantas podem ser cultivadas em maior adensamento nas bancadas, aliada à possibilidade de escalonamento da produção;
– Proteção do cultivo contra adversidades do clima, de pragas e de doenças. Por serem cultivadas em bancadas elevadas, geralmente em estufas, as plantas ficam menos susceptíveis aos ataques de pragas, bem como protegidas de chuvas fortes, geadas, e ou insolação intensa;
– Produção de qualidade durante todas as estações. Em regiões onde as estações do ano são caracterizadas por condições climáticas distintas, a hidroponia pode amenizar os efeitos negativos dessas características;
– Melhores condições de trabalho. Como as bancadas são elevadas, o agricultor ou funcionário trabalha em uma posição de maior conforto, sem a necessidade de ter que se agachar e levantar constantemente. Além disso, por se prezar pelo condicionamento de conforto para a planta, automaticamente tal condicionamento pode oferecer um conforto ambiental também ao operador.
– Uso racional de água e nutrientes. Por ser um sistema onde a irrigação é localizada e geralmente com reaproveitamento de solução recirculante, o uso de água e de nutrientes é reduzido;
– Redução ou paralisação do uso de defensivos. Tendo em vista a proteção do cultivo e a menor exposição do plantio às pragas, o uso de defensivos pode ser reduzido e, em muitos casos, até ser erradicado.
Solução nutritiva
Um dos principais insumos para a produção de alface alcançar um ótimo padrão de qualidade na hidroponia é a solução nutritiva, pois é através dela que se entrega para a planta a água e os elementos minerais.
Uma solução nutritiva de boa qualidade começa com a qualidade da água, que deve respeitar determinados padrões denominados físico-químicos, além de estar livre de contaminantes biológicos.
Os padrões físico-químicos são os relativos às condições de temperatura, pH, presença de minerais e turbidez. Para uma água ser considerada apropriada para a hidroponia, deve ter pH de 6,0 a 7,0, pouca ou nenhuma quantidade de sais, cuja somatória não faça a água atingir valores de condutividade elétrica maior de 0.20 mS/cm. Ainda, deve ter aparência cristalina, sem turbidez.
Quanto aos aspectos microbiológicos, é de grande importância que a água não seja contaminada por qualquer tipo de fungo ou bactéria, e que não contenha, por exemplo, restos de outras culturas, fungos, limo ou outras espécies de microalgas.
A água contaminada por algum agente biológico indesejado pode contaminar o sistema hidropônico em um curto tempo, vindo a comprometer a produção. É recomendado ao produtor que este faça pelo menos um teste laboratorial por ano para monitorar a qualidade da água que será empregada na solução.
Ponto de equilíbrio
Outro ponto a se destacar em relação à solução nutritiva é o tocante à parte de fertilizantes, ou os sais minerais que compõem tal solução nutritiva. O produtor deve sempre ficar atento à qualidade desses produtos, bem como ter cuidados com o armazenamento destes.
Para o preparo, é válido destacar a correta pesagem de cada componente, de acordo com as quantidades recomendadas para a cultura da alface. No Brasil, há um consenso em se utilizar a solução nutritiva proposta pelo professor Dr. Roberto Furlani, em meados da década de 80.
É uma solução que foi aprimorada para as diversas regiões do País, e que, com pequenas variações efetuadas pelos produtores ou técnicos locais, vem trazendo ótimos resultados de produção.
Na tabela a seguir é mostrada a solução sugerida por Furlani, e que é a mais usada e serve de base para a maioria dos produtores. A quantidade de sais é para se fazer 1.000 L., com condutividade próxima a 1,8 mS/cm.
Sal (Fertilizante) | Gramas/1000 L. |
Nitrato de Calcio | 750 |
Nitrato de Potássio | 500 |
MAP (Mono amônio fosfato) | 150 |
Sulfato de Magnésio | 400 |
Sulfato de cobre | 0,15 |
Sulfato de zinco | 0,5 |
Sulfato de manganês | 1,5 |
Ácido bórico | 2,3 |
Molibdato de amônio | 0,15 |
Ferro EDDHMA 6,5% | 30 |
Os produtos em destaque são os que se conhece por macronutrientes, ou seja, os que a planta precisa em grande quantidade, e os produtos não destacados na tabela são os micronutrientes, ou seja, aqueles elementos minerais que a planta precisa em pequenas quantidades.
Erros e acertos
Um erro muito comum entre os produtores é desconsiderar a importância dos elementos micronutrientes. Em razão da planta precisar destes em baixíssima quantidade, quando comparados aos macronutrientes, alguns produtores podem ter a falsa impressão que podem ser suprimidos da formulação, fato esse que pode ser desastroso no aspecto produtivo.
Outro erro que comumente ocorre é relativo a erros de pesagem de cada elemento. Uma dica pra não errar no momento do preparo é concentrar-se ao máximo na tarefa, evitando distrações, e assim dosar cada nutriente de forma correta.
Opções
Atualmente, são oferecidos produtos complexados e formulados de acordo com a necessidade de cada cultura, e para a cultura da alface existem também produtos formulados.
Esses produtos contêm todos os elementos minerais em apenas quatro e até mesmo em dois produtos. A principal vantagem destes produtos é a facilidade nas operações de pesagem e diluição no momento de fazer a solução.
Uma vez preparada a solução, esta deve ser monitorada diariamente para conferir os parâmetros de pH e condutividade elétrica.
Recomendações
Para o cultivo da alface, o recomendado é que se conduza com pH em torno de 6,0 e a condutividade elétrica entre 1,5 para situações de temperatura mais elevadas e até 1,9 para temperaturas amenas.
A correção diária destes parâmetros garantirá que a planta possa expressar o seu máximo aproveitamento nutricional e, consequentemente, seu melhor desenvolvimento. Outro cuidado importante é realizar a troca periódica de toda a solução nutritiva (pelo menos uma vez a cada mês), para assim garantir que esteja sem contaminantes, como restos de substratos, folhas que por ventura venham a cair no canal de cultivo, bem como prevenir a proliferação de algas.
Outro cuidado em relação à solução é mantê-la protegida no reservatório. Isso evita a entrada de pequenos animais que podem estar presentes no local da estufa. Além disso, a proteção contra a incidência de luz solar garante que os componentes da solução sensíveis à luminosidade não se degradem e que não haja crescimento de algas.
Investimentos
Os custos de implantação de um sistema hidropônico NFT para alface atualmente ainda são considerados moderados a altos, tendo em vista que a estrutura envolve perfis em PVC ou polipropileno, bancadas, reservatórios para a solução nutritiva, bombas, instalações elétricas robustas e bem planejadas, além do próprio custo com a construção da estufa agrícola.
Os custos vão variar bastante de acordo com o nível tecnológico aplicado, bem como a composição dos materiais e da estufa agrícola.
Em média, uma estufa de 10 x 50 m, com estrutura feita em aço galvanizado, que tem maior durabilidade, e bancadas de hidroponia em tubos de PVC, e capacidade para produzir aproximadamente 8.000 pés de alface/mês, tem um custo aproximado de R$ 130.000,00.
O custo de produção de um pé de alface depende muito da escala de produção. Quanto maior a capacidade produtiva de uma horta, menor será o custo de produção. Hoje, a média do custo de produção é de R$ 1,40 por pé, considerando mão de obra, depreciação da estufa, custos com insumos e logística de entrega.
Lembrando que esse é um valor médio, podendo variar de acordo com o tamanho da unidade produtora, com a região e com os materiais empregados.
Estando o preço médio de venda da alface hidropônica em R$ 2,70, o lucro obtido é de R$ 1,30 por pé produzido, gerando um lucro de R$ 10.400,00 mensalmente. O retorno do investimento se dá em 14 meses, aproximadamente.
Realidade
Esses números são perfeitamente factuais para parte dos produtores. Já para outra parte, podem não ser tão condizentes como o caso apresentado acima. Alguns fatores podem fazer com que o rendimento do negócio para uns não seja tão promissor quanto é pra outros.
Dentre os principais fatores de divergência, podemos destacar:
• A sazonalidade de oferta do produto, em regiões onde em determinadas épocas do ano o preço oscila devido à concorrência direta com a alface produzida em sistema convencional;
• A ocorrência de pragas ou doenças em determinadas épocas do ano, sem que o produtor a combata em tempo hábil;
• Manejo inadequado, fazendo com que a unidade produtora não entregue o potencial máximo de produção.
Para evitar esse tipo de ocorrência, o produtor deve buscar formas de diversificar a produção e aumentar os pontos de venda, quando possível, além de fazer o acompanhamento de pragas e doenças ao longo do ano, fazer o manejo de acordo com as recomendações técnicas, e sempre buscar se atualizar para acompanhar as tendências de mercado.