Jefferson Henrique Santos Silva – Engenheiro agrônomo e doutorando em Agronomia/Fitotecnia – Universidade Federal de Lavras (UFLA) – eng.jeffhenrique@gmail.com
As novas fontes de energias renováveis têm um importante
papel no abastecimento do setor elétrico do País. O aumento populacional e o
crescimento econômico demanda mais energia elétrica do setor, e as novas fontes
de energias renováveis vêm como uma solução para suprir essa necessidade.
Atualmente, a matriz elétrica brasileira é majoritária de
fontes renováveis, constituída por aproximadamente 82,9%. Graças à abundância
de recursos hídricos do País, 103,0 GW (59,9%) da energia elétrica é gerada
pelas usinas hidrelétricas.
Apesar de ser uma fonte de energia limpa e renovável, tem
suas limitações. As construções de usinas hidrelétricas acarreta em grandes
impactos ambientais e sociais, podendo afetar grandes áreas, mudando até o
ecossistema da região, além de ser um modelo de produção instável, pois a
quantidade de energia gerada varia de acordo com a vazão do rio, ou seja, do
volume de água disponível.
Diversificação
A dependência de apenas uma fonte de energia na matriz
energética deixa o País exposto a uma crise de abastecimento. Por isso, a nova
política energética busca diversificar e descentralizar suas fontes. A
diversificação e a descentralização reduzem os riscos de um colapso na produção
e abastecimento de energia, e nas perdas que são geradas pelo elevado potencial
elétrico para sua distribuição.
O Brasil encontra-se na zona intertropical no globo
terrestre. Mais precisamente, 93% do território está localizado no Hemisfério
Sul, e apenas 7% no Hemisfério Norte. Essa posição geográfica, associada à sua
grande extensão territorial, favorecem uma grande variedade de recursos
naturais, que podem ser transformados em energia. Isso permite que os governos
explorem o potencial do País, introduzindo novas fontes de energia na matriz
energética.
Fontes renováveis
O uso de novas fontes de energias renováveis, como eólica,
solar e biomassa, vêm gradualmente ganhando espaço na matriz energética. O uso
dessas fontes, além de diversificar e descentralizar a matriz energética do
País, também causa um impacto socioeconômico, já que promove geração de emprego
e renda.
Hoje a energia eólica representa 18,0 GW, 10,3% da matriz
elétrica nacional, com expectativa de atingir, até o final deste ano 11,2%. Ela
está presente em 12 Estados das regiões nordeste, sul e sudeste, contando com
695 parques e mais de 8.300 aerogeradores, e com previsão de produção de 28GW
até 2024.
Já a energia fotovoltaica (solar) representa 1,9% da matriz
elétrica do País, com 3.893 usinas solares em operação, pretendendo atingir
2,6% até o fim de 2021. Atualmente, a biomassa é a fonte de energia que mais
cresce e que mais tem potencial para fornecer eletricidade – espera-se uma
contribuição de 60% de energia renovável global até 2030.
Esse aumento tem um papel imprescindível nas metas de
redução de emissões de poluentes e de desenvolvimento sustentável. O Brasil
possui situação privilegiada para produção de biomassa em larga escala, pois
existem extensas áreas cultiváveis e condições climáticas favoráveis ao longo
do ano.
Bioeletricidade
A produção de bioeletricidade no Brasil é predominantemente
gerada por meio do resíduo industrial do setor canavieiro. A cana-de-açúcar é a
terceira maior cultura do Brasil, fechando a safra de 2020/21 com 654,8 milhões
de toneladas de cana moída, em uma área de produção de 38,7 mil ha.
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A utilização do bagaço da cana-de-açúcar é uma ótima
representação de como o país consegue utilizar bem os recursos que tem para
gerar energia. Cada tonelada de cana moída resulta em aproximadamente 280 kg de
bagaço, correspondendo a cerca de 30% do total da cana colhida, dos quais 90%
são usados na combustão para o aquecimento das caldeiras e na geração de
energia elétrica.
De toda a energia gerada, 36% é consumida na usina e o
restante vendido para a companhia elétrica, contribuindo com 6,9% para a matriz
energética brasileira.
Receitas
Segundo o Programa de Educação Continuada em Economia e
Gestão de Empresas (Pecege), em 2018/19, cada tonelada de cana gerou uma
receita de R$ 9,95 para as unidades que comercializaram bioeletricidade.
O incremento para uma usina média do setor foi de R$ 23,94
milhões na temporada. A Raízen apresentou o melhor desempenho na cogeração de
energia, rendendo R$ 1,23 bilhão na safra 2018/19. O grupo possui um total de
26 usinas e é o maior do País – ocupa a primeira colocação na produção de
energia com a biomassa, com a cogeração de 2,47 TWh.
Em destaque
A maioria das usinas produtoras estão nos Estados de São
Paulo, Mato Grosso, Minas Gerais e Goiás. São Paulo ocupa a primeira posição na
cogeração, justamente por concentrar a maior quantidade de usinas.
Das 422 usinas, apenas 40% vendem energia elétrica, os 60%
restantes não tem concessão com a rede de destruição, devido ao elevado custo
inicial, apara os investimentos das linhas de transmissão e conexão. Para
interligar ao sistema, em média, são gastos R$ 1 milhão a cada quilômetro de
linha de transmissão.
E, em alguns casos, é necessário investir também na
construção de uma subestação de energia e promover a conexão. Segundo o gerente
de Bioeletricidade da Unica (União da Indústria de Cana-de-açúcar), o setor tem
potencial para representar 27% da geração de energia nacional.
Caso o bagaço seja utilizado exclusivamente para a produção
de energia elétrica, seria possível produzir cerca de 200 kW/h de energia
elétrica por tonelada de cana em sistemas eficientes, mas atualmente, as usinas
produzem menos do que 50 kW/h por tonelada.
A palha e a ponteira da cana não são aproveitadas para fins
industriais ou energéticos, ainda são deixadas no campo. Estudos já realizados
indicam que aproximadamente 50% da palha gerada poderá ser retirada do campo,
com ganhos para a área agrícola e meio ambiente. O aproveitamento da palha e
ponteira, como fonte de energia, resultará em significativos ganhos energéticos
para o setor.
Entre um e outro
Fazendo uma comparação do conteúdo energético de uma
tonelada de cana-de-açúcar, 1.718.000 kcal, com o potencial energético de um
barril de petróleo, que é de 1.386.000 kcal, ou seja, uma tonelada de cana
equivale energeticamente a 1,24 barril de petróleo bruto.
Considerando que a produção da safra de 2020/21 foi de 654,8
milhões de toneladas, temos que, em equivalentes energéticos, esta safra
correspondeu a 796,7 milhões de barris de Petróleo ou 2,2 milhões de barris/dia,
valor muito próximo ao consumo nacional de petróleo, que é de 3,1 milhões de
barris/dia.
Energia do bagaço da cana de
açúcar?
Após a cana ser colhida no campo, é levada para as usinas,
onde passa pelo processo de moagem. Nesse processo, a cana é prensada na moenda
da usina, onde é obtido, de um lado, o caldo e, do outro lado, o bagaço,
representado pelo resíduo fibroso da cana.
Esse bagaço é levado até a caldeira da usina, que é o
equipamento onde ocorre a combustão desse material. O vapor gerado dentro
dessas caldeiras é então direcionado para uma turbina.
Nessa turbina, o vapor consegue movimentar as pás do rotor
que irão gerar energia mecânica, a qual, por sua vez, é convertida em energia
elétrica em um gerador acoplado ao eixo da turbina. Essa energia elétrica é
finalmente lançada na rede de distribuição elétrica.
Como visto, a geração de energia elétrica a partir do bagaço
de cana de açúcar é um processo bastante simples. Porém, muitas unidades
industriais ainda têm caldeiras e incineradoras de bagaço que não apresentam a
mesma eficiência, com quantidade e qualidade inferior que caldeiras mais
modernas, inviabilizando essa geração.
Por isso, é preciso que exista uma política pública no
incentivo da substituição das caldeiras mais antigas por modelos mais modernos
e eficientes.
As caldeiras antigas eram menores porque não necessitavam de
muito bagaço e a produção de bagaço não era desejado, pois ocupava muito espaço
nos pátios das usinas. Mas hoje, o valor agregado no bagaço é tão elevado quanto
o custo de 1,0 tonelada de cana-de-açúcar. Por essas razões, a modernização das
plantas geradoras de energia é fundamental e contribuirá com a geração de
energia a partir desta importante matéria-prima para o país.
Vantagens da cana na produção de
energia
A geração de energia pela queima do bagaço possui diversas
vantagens, principalmente em relação ao uso de fontes termelétricas, como a
queima de carvão mineral ou petróleo. Dentre as vantagens, podemos destacar:
• Alta competitividade em função do custo: como a
cana-de-açúcar já é plantada para a produção de etanol, a utilização do bagaço
para a produção de energia é altamente viável, tornando a energia barata e
competitiva no mercado.
• Supre a sazonalidade das chuvas: como grande parte da
energia elétrica gerada no País é proveniente das hidrelétricas, que dependem
das chuvas para garantir o nível dos reservatórios, a queima do bagaço da cana
é ótima forma de suprir a menor produção de eletricidade nos períodos de seca.
• Redução das emissões de gases do efeito estufa: por ser
totalmente renovável, a cana-de-açúcar reduz a poluição e o agravamento do
efeito estufa.
• Geração de emprego: a produção desse tipo de energia é um
grande incentivo para a economia, pois possibilita a geração de empregos desde
a lavoura até a mão de obra capacitada nas usinas e terminais de distribuição
de energia.
• Grande disponibilidade: além da vantagem ambiental em
relação às usinas termelétricas, o bagaço de cana também possui maior
disponibilidade e melhor acesso.