A região centro-oeste é atualmente a principal área de
expansão da cana-de-açúcar no Brasil. Pesquisadores da Embrapa estudam formas
de mitigar as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera decorrentes desse
cultivo por meio de estratégias diferenciadas de adubação e irrigação.
O óxido nitroso (N2O) foi objeto de um trabalho
de pesquisa devido ao seu potencial de aquecimento global (265 a 298 vezes
maior do que da molécula de dióxido de carbono) e ao elevado potencial de
emissão desse gás associado à produção da cana.
Durante dois anos, foram coletados dados ao longo de um
experimento com cana-de-açúcar no Cerrado para avaliar efeitos das aplicações
de vinhaça e nitrogênio e, também, da irrigação.
“Identificamos que os fluxos de óxido nitroso do solo em
áreas de cana-de-açúcar submetidas a tratamentos de nitrogênio e vinhaça são,
em média, pelo menos três vezes maiores do que quando aplicados separadamente”,
afirmou a pesquisadora Arminda de Carvalho, responsável pela condução da
pesquisa na Embrapa Cerrados. Esse estudo faz parte de projeto liderado pela
pesquisadora Magda Lima, da Embrapa Meio Ambiente.
Nitrogênio
O principal responsável por essas emissões, segundo os
especialistas, é o aporte de nitrogênio (N) aos solos agrícolas, tanto na forma
de fertilizantes sintéticos como orgânicos. Cerca de 1% do N aplicado é
convertido em N2O.
Esse “fator de emissão”, de acordo com os pesquisadores,
pode variar em função do solo, do seu manejo e de outras práticas agrícolas,
como por exemplo a irrigação, e em geral é inferior a 1% nas condições dos
solos agrícolas bem drenados do Cerrado. Porém, aumenta proporcionalmente com a
dose ou combinação de N e vinhaça aplicados na cultura da cana-de-açúcar.
A vinhaça é um subproduto da destilação de bioetanol, rico
em nutrientes e existem preocupações de que sua aplicação possa agravar o
problema de emissão de N2O em áreas onde adubos e irrigação já são
utilizados. “O estudo revelou que aplicar N e vinhaça em intervalos bem
espaçados é uma estratégia eficaz para mitigação das emissões de N2O
e para produção ambientalmente mais sustentável. Mas, é necessário, ainda,
identificar a melhor combinação dessas fontes, com doses e intervalo de
aplicação, buscando-se reduzir as emissões”, pondera.
Irrigação
Com relação à irrigação, foram conduzidos estudos sem
aplicação de vinhaça avaliando diferentes regimes baseados na demanda
evapotranspirativa (com regimes de 17, 46 e 75%) e na prática comumente
utilizada pelos agricultores (irrigação de salvamento) para a produção de cana-de-açúcar
no Cerrado.
A pesquisa revelou que os resultados desses regimes de
irrigação foram semelhantes quanto às emissões de óxido nitroso. No entanto, a
pesquisadora Arminda de Carvalho afirma que é essencial adotar um regime de
irrigação que aumente a produtividade. No estudo, o regime de 75% foi o que
apresentou produtividades maiores, quando comparado aos níveis de irrigação
inferiores (irrigação de salvamento e 17%).
Gás de efeito estufa: óxido
nitroso (N2O)
De acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças
Climáticas (IPCC), era necessário limitar o aumento da temperatura da
superfície global, entre 2011 a 2020, a um máximo de 1,5 a 2ºC.
Porém, a temperatura já subiu 1,1ºC em relação ao período
entre 1850 e 1900. O Brasil, signatário do acordo de Paris, tem metas
obrigatórias para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, um indicativo
de meta para 2030 de 43% de redução (1,6 GtCO2e) em relação aos
níveis de 2010.
Em um cenário pessimista do IPCC (SSP5-8.5), mas bastante
apropriado ao padrão de consumo mundial, é possível chegar a 2,0ºC até 2051.
Para que isso não corra, é preciso que haja redução e mudança no portfólio das
emissões dos principais gases de efeito estufa, entre eles o N2O.
De acordo com o III Inventário Brasileiro de Emissão de
Gases de Efeito Estufa (MCTI, 2016), o setor agropecuário responde por 87,1%
das emissões de óxido nitroso, sendo a fertilização nitrogenada e a
mineralização de resíduos orgânicos apontadas como os principais fatores
geradores desse gás.
Principais resultados do estudo
• A aplicação, separadamente, de vinhaça e fertilizante
nitrogenado promove emissões de N2O, em média, pelo menos três vezes
menos do que quando feito conjuntamente, confirmando as mesmas tendências
verificadas em outros estudos realizados no País.
• Aplicações de vinhaça e fertilizante nitrogenado devem ser
realizadas separadamente, com intervalo de pelo menos um mês para evitar o
efeito sinérgico da aplicação conjunta nas emissões de N2O.
Na ausência de vinhaça, o aumento da irrigação em até 75% da
demanda evapotranspirativa da planta em relação à irrigação de salvamento e de
17%, pode ser considerada uma opção para incremento da produtividade da
cana-de-açúcar, uma vez que os fluxos de N2O não foram influenciados
pelos regimes hídricos avaliados.
• As emissões acumuladas de N2O variaram entre os
tratamentos avaliados, de 0,1 a 7,4 kg N-N2O ha-1.
• O fator de emissão médio foi 1,34 ± 0,68%.
Equipe de pesquisa
Participaram da pesquisa especialistas da Embrapa, da
Universidade de Cambridge e da Universidade de Brasília. São eles Arminda
Moreira de Carvalho; Alexsandra Duarte de Oliveira; Thomaz A. Rein; Walter
Quadros Ribeiro Júnior, Adriano Dicesar Martins e Thais Rodrigues Coser
(Embrapa); Jéssica F. da Silva e David A. Coomes (Universidade de Cambridge); e
Maria Lucrécia Ramos, Thais Rodrigues de Sousa, Cristiane Andrea de Lima e
Douglas L. Vieira (Universidade de Brasília).