Nitrogênio de liberação lenta ou controlada

Nitrogênio de liberação lenta ou controlada

Roberta Camargos de Oliveira Engenheira agrônoma, doutora e pós-doutoranda – Universidade Federal de Uberlândia (UFU)robertacamargos@gmail.com

Fernando Simoni Bacilieri Engenheiro agrônomo, doutor e professor da UNOPAR – Ponta Grossa (PR)ferbacilieri@gmail.com

A batata apresenta cadeia de produção crescente. A maior
parte da produção brasileira é destinada ao consumo in natura, no
entanto, nos últimos anos observa-se expansão do setor de processamento,
especialmente na forma de batata frita, pré-frita e desidratados. Tudo isso
graças à ampla versatilidade gastronômica dos tubérculos.

Essa realidade traz novas demandas para produtores e
pesquisadores, cuja necessidade de ampliação e melhor aproveitamento das áreas
de produção se tornam cada vez mais urgentes. A busca de alternativas para
obtenção de eficiência e otimização dos recursos englobam todas as etapas da
produção, principalmente em relação aos cuidados com o solo e a água.

Manejo rumo à produtividade

Dentre os fatores de manejo que resultam em acréscimo de
produtividade, o suprimento de nutrientes às plantas merece destaque, pois
contribui de forma decisiva para o incremento da produtividade e qualidade do
produto colhido, especialmente em culturas altamente responsivas à aplicação de
fertilizantes como a batata.

Os maiores incrementos em produtividade relacionam-se à
aplicação de fósforo, nitrogênio e potássio, nesta ordem. O nitrogênio (N)
aumenta o crescimento vegetativo das plantas, intensifica a cor verde da
folhagem e retarda a maturidade.

Desafio para a bataticultura

Um grande desafio é fornecer a quantidade de N necessário no
momento adequado, pois o sistema radicular da batata é considerado superficial
e delicado, com baixa eficiência de uso de N (absorção variando entre 40 e 60%
do total de fertilizante aplicado).

Em batata as adubações são pesadas, portanto, a adubação
precisa ser bem direcionada, pois grandes quantidades de fertilizante N podem
ser perdidas, caso não seja realizado um bom planejamento inicial.

Embora maximizar o rendimento seja a meta geral, muitos
fatores influenciam na tomada de decisão da fertilização, incluindo a época de
aplicação, custo dos insumos e disponibilidade de recursos. Avaliações de taxas
de N que proporcionem maior retorno econômico também devem ser consideradas.

A motivação para melhorar a eficiência do uso de
fertilizantes ultrapassa as questões agronômicas e engloba também questões
ambientais e de saúde humana. As perdas econômicas relacionadas às perdas de N
nos EUA giram em torno de US$ 39 bilhões anualmente.

Além disso, a contaminação das águas com concentrações de
nitrato (NO3), excedendo o limite de 50 mg L-1
na água potável, o que impacta a saúde humana, com consideráveis registros
anuais de câncer nos EUA atribuíveis ao excesso de NO3
na água potável.

Com o aumento do uso de fertilização, o uso inadequado de N
pode resultar em várias formas de poluição ambiental, incluindo degradação do
solo e da sua fertilidade, eutrofização da água e aumento das concentrações
globais de óxido nitroso, que atua como um gás de efeito estufa.

A lixiviação de nitrato pode ser exacerbada em métodos de
irrigação que têm baixa eficiência no uso de água devido à aplicação de volumes
excessivos.

Benefícios

Os fertilizantes de liberação lenta ou os fertilizantes de
liberação controlada (fertilizantes revestidos- FR) podem efetivamente aliviar
tais problemas, reduzindo a perda de nutrientes e melhorando a utilização de N.

Redução na frequência de aplicação e minimização de
potenciais efeitos negativos associados à dosagem em excesso também estão
associados ao FR. Na literatura, há relatos sobre efeitos benéficos também na
retenção de umidade e nas interações da rizosfera, com reflexos positivos em
parâmetros produtivos.

Os fertilizantes de liberação lenta são classificados em
quatro tipos:

• Materiais inorgânicos de baixa solubilidade (fosfatos de
amônio metálico);

• Materiais de baixa solubilidade com degradação química ou
biológica (uréia-formaldeído);

• Materiais relativamente solúveis que se decompõem
gradualmente no solo;

• Materiais solúveis em água controlada por uma barreira
física, como materiais revestidos (FR).

Composição

Os FR são fertilizantes convencionais (como a ureia)
recobertos com uma barreira física que irá controlar a passagem de N por
difusão ou por rupturas no material de revestimento. Diversos compostos podem
ser utilizados para recobrir os grânulos do fertilizante, tais como: enxofre
elementar, resinas plásticas, termoplásticos, poliuretano, polietileno, dentre
outros.

Comparado com os fertilizantes convencionais de N, os FR
devido à liberação lenta distribuem o N mais uniformemente. O fornecimento
gradual reduz a perda desnecessária de N, especialmente no estágio inicial das
plantas, onde as raízes ainda estão em formação e a demanda por nutrientes nesse
momento é menor.

Com isso, o nutriente estará presente para a absorção quando
as plantas estiverem no pico máximo de desenvolvimento, com demanda máxima
(tuberização), ou seja, é interessante que o recobrimento permita a liberação
de N em taxa semelhante à capacidade de absorção de N pela cultura. 

A maioria dos FR é constituída por ureia – o fertilizante N
mais comumente usado e cuja transformação em amônia (NH3) e CO2
em solo úmido é muito rápida. Os FR, em geral, por volta de menos de 15% do
nutriente são liberados em um dia, 15 a 75% do nutriente são liberados em 28
dias e pelo menos 75% do nutriente são liberados no tempo de liberação
declarado.

Classificação

Os FR podem ser classificados com relação ao tipo de
material de revestimento (orgânico e inorgânico), modo de ação (incluindo
inibição da atividade da urease e inibição da nitrificação), formulações de
nutrientes compostos, uso de minerais naturais ou suas versões sintéticas e
utilização de nanotecnologia. 

Explorar os FR é importante para promover uma agricultura
sustentável. Porém, é importante que o FR possua coordenação entre a liberação
lenta, o tipo de revestimento polimérico e o nível da água de irrigação, para
garantir que ocorra sinergia e melhor aproveitamento pelo sistema radicular da
batateira.

Revestimentos naturais vêm sendo estudados para tornar o
investimento em FR mais acessível e também mais sustentável. Materiais como a
cera de parafina, por exemplo, podem constituir uma forma de revestimento, com
bom desempenho devido às suas propriedades hidrofóbicas, baixo custo, baixo
ponto de fusão, biodegradabilidade e baixa contaminação do solo.

Os revestimentos de parafina são semelhantes aos
revestimentos de enxofre, sendo estes não elásticos, ou seja, quando a pressão interna
formada pela dissolução do fertilizante excede a resistência da membrana, o
revestimento se rompe e ocorre a liberação da ureia.

Polímeros naturais e seus derivados usados como materiais de
revestimento também recebem considerável interesse, com base nas propriedades e
características dos polímeros. A celulose é o polímero natural mais abundante e
é uma matéria-prima muito promissora a baixo custo. A associação com agente
hidrofóbico permite uma alternativa de liberação lenta de valor mais acessível.

Na prática

Em geral, é possível observar no campo resultados
contrastantes em relação à resposta das culturas, comparando os fertilizantes
de N de liberação lenta com as fontes 100% solúveis, como a ureia. 

Encontramos na literatura científica, bem como em testes
lado a lado realizados por produtores, incrementos no total de tubérculos,
porém, sem afetar a produção da classe de maior valor comercial (Especial).

Incrementos de produção com doses menores de N do que
aplicado 100% solúvel, e em outros tantos casos, não se observam diferenças
significativas entre os fertilizantes. Em todos os casos, é sempre válido lembrar
que os benefícios vão além do rendimento da cultura.

Vantagens como redução da lixiviação de N e aumento da
eficiência do uso de N precisam ser consideradas pelos produtores,
principalmente pelo acúmulo de pontos positivos no ambiente em que as plantas
vão se desenvolver ao longo dos ciclos de cultivo, o que inclui todas as
características físicas, químicas e biológicas do solo.

Custo

De fato, o impedimento do uso em larga escala destes
fertilizantes tem sido o elevado custo (1,5 a 10 vezes maior que o da ureia
convencional), sendo o custo dos fertilizantes variável de acordo com as fontes
de N que o compõem, os componentes que formam os revestimentos e a
disponibilidade na região produtora.

As condições climáticas (em especial: temperatura e umidade
do solo), tipo de solo, variedade de batata, época do ano, entre vários outros
fatores que estão em dinâmica durante o ciclo de cultivo podem afetar o
desempenho dos FR.

Também é possível que os produtores façam uma combinação dos
fertilizantes. Para obtenção de eficiência agronômica, econômica, ambiental e
social é necessário avaliar o sistema como um todo e colocar na ponta do lápis
qual será o objetivo do cultivo.

O objetivo é o lucro? Poderá haver grandes prejuízos de
ordem ambiental em longo prazo. O objetivo é a sustentabilidade? Poderá haver
menor lucro, porém, o sistema em equilíbrio permite rendimentos mais harmônicos
em longo prazo.

Avaliar alternativas também pode auxiliar na tomada de
decisão e ter um resultado mais interessante, como por exemplo: como consigo
maior eficiência de nutrientes e altos rendimentos? Poderia ser por
parcelamento da dose? Isso seria viável em termos operacionais? Poderia ser
aplicando fertilizantes solúveis via fertirrigação? Adoção de outra tecnologia
(organominerais) seria mais interessante que os FR? Poderia ser escolhendo
melhor a fonte, o revestimento de FR com melhor custo/beneficio?

Na batata

Há evidências de respostas positivas de FR em batateira,
porém, como não há um consenso geral de sua viabilidade, especialmente
econômica, o uso no cultivo de batata ainda é esporádico.

Continuar testando novos produtos, com novos polímeros, é imprescindível e a abertura dos produtores para efetuar testes em suas realidades (dentro de manejos e climas distintos) é primordial e deve ser entendido como um investimento, em especial por ser a nutrição um dos principais pontos que regem o cultivo e a sustentabilidade.

Fonte: https://revistacampoenegocios.com.br